Imagem retirada de mensagens.culturamix.com/ |
Há quase sete meses eu vinha em um silêncio literário. Nenhuma palavra, nenhum novo relato. Não que eu não tivesse aprendido nada; não que eles, os pacientes, não continuassem a me ensinar mais e mais. Era um silêncio meu, a vida que nos consome. Então tive a pretensão de resumir esses dias silenciosos, mas de antemão sei que não terei como conseguir. Não tenho como falar de cada um deles e de seus ensinamentos assim, de supetão. Mas posso falar do que estive aprendendo esses dias.
...
Há alguns meses estive doente, bem doente. E pude ver como achamos sempre que somos fortes demais até que nos vemos dependentes. Mal pensamos na fragilidade da vida até que vemos que "não é bem assim". Ademais, ESSES DIAS COMO "PACIENTE" ME ENSINARAM COISAS QUE NÃO TINHA LIDO NO ROBBINS, NO PORTO OU NO HANG&DALE. Em nenhum deles me dizia que eu iria chorar por não poder mudar o rumo dos sintomas ou que eu não dormiria por noites seguidas. Mas um paciente me diria isso tranquilamente. Não, não estou desmerecendo as grande referências da Medicina, elas são ainda importantíssimas para nós, eternos acadêmicos. Entretanto, os nossos maiores aprendizados são com aqueles a quem devíamos sempre ouvir, calmamente perguntar o que eles tem a nos relatar...
Aprendi ainda nesses dias de silêncio que tem pré-julgamentos que estão tão entranhados em nossas mentes que sempre precisamos nos policiar para não voltar ao velho julgo. Como naquele dia em que eu estava sentada no banco, duas e meia da madrugada, olhando uma paciente de quinze anos a gritar, e gritar, e gritar pedindo para tirar aquela dor dela, que resolvesse a gestação agora, "Tira isso de mim", ela dizia. O que você pensaria nessa hora? Quantas vezes não foram repetidas as frases "Pra fazer foi bom" naqueles corredores, quantos olhares de julgamento ela não recebeu ao entrar nos ambulatórios, ao pegar a fila preferencial, ao entrar pela frente no ônibus. ELA CHAMOU SUA MÃE, PEGOU SUA MÃO E COLOCOU JUNTO AO SEU ROSTO. "Pede pra eles tirarem logo, mãe". Aquela senhora olhava para mim, olhos marejados e eu, covarde, desviei o olhar para o display do cardiotocógrafo.
Quando o exame terminou, depois de tentar explicar, em vão, para a paciente que tudo corria conforme o esperado, aquela mãe ainda me olhava em desespero. Chamei-a e expliquei ainda outra vez o que já havia dito - exames normais, tudo dentro do esperado. Mas aquelas não eram as palavras que ela queria ouvir, para ela só importava que sua filha não sentisse mais a dor.