terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Desliguem os aparelhos

Imagem retirada do blog sou-o-que-digo-e-penso.blogspot.com
Dava uma olhada na movimentação: horário de visita. Sempre me interesso em olhar essa relação de visitante-paciente. Lógico, não quero ouvir suas conversas, mas acho bonito o fato de o visitante manter o contato do paciente com o mundo externo, para além das paredes verdes daquele hospital.
De repente fora retirada do meu "transe" por uma senhora que me chamou ao leito da sua mãe. As lágrimas já haviam secado no seu rosto e faziam dois caminhos que cortavam seu rosto em pontos simétricos. Ela estava maquiada, porém seu semblante estava cansado, como o de alguém passou dias entre vindas ao hospital e idas para seu lar/trabalho. Seu tom de voz, um pouco elevado, me perguntava quem estava acompanhando o caso da mãe dela.

- Senhora, vou pegar o prontuário para identificar quem é o médico responsável por ela - eu disse.

Ela então disparou uma série de queixas que, certamente, estavam entaladas em sua garganta. Talvez ela tenha pensado em dizer isso há bastante tempo, mas lhe faltava coragem e, em meio ao desespero de ver sua mãe por tantos dias ali, em um leito hospitalar e respirando com o auxílio de aparelhos (e apenas pelo seu auxílio), ela decidiu dizer:

- Pelo amor de Deus, porque vocês não desligam logo esses aparelhos?

Lógico, ela não queria sua mãe morta: ela queria ela sem sofrimento. NÓS GERALMENTE NÃO PENSAMOS EM MORTE ATÉ DEPARARMOS ELA, MAS É IMPORTANTE QUE NOS QUESTIONEMOS QUAL SERIA O MAIS VIÁVEL, OU MENOS DOLOROSO, OU AINDA, QUAL SERIA O DESEJO DO PACIENTE SE ESTE ESTIVESSE EM CONDIÇÕES DE SE EXPRESSAR!
Depois que ela saiu, voltei ao leito e olhei a senhora já de idade bastante avançada. O que ela diria a sua filha? Talvez agradecesse pela coragem de se expressar, refletindo o que ela própria falaria. Talvez ela ficasse zangada pela mal-criação da sua "menina". O fato é que, ainda naquela tarde, depois de eu ter remoído diversas vezes as palavras que a filha havia me dito, a senhora veio a falecer, dando tempo de uma última visita da filha que sofria e dos outros familiares que sentirão falta daqueles cabelos branquinhos-branquinhos que por longos dias repousaram no lençol do hospital.

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