quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Fiapinhos que se vão!

Imagem retirada de gommo.com.br
Ela entrou no consultório. Cabelo feito, boca pintada, vestido limpo, agitada. Estava visivelmente nervosa e contava-nos o que lhe havia acontecido. Eventos tristes, cenas que se repetiam nas noites em claro. Segurava um terço nas mãos que rodava, rodava. As unhas não estavam pintadas, mas eram bem cuidadas. Nos falava das dores que sentia na alma e na falta de vontade que tinha na vida. FALAVA DA VONTADE DE MATAR E NO DESEJO DE MORRER! Disse o quanto era dependente da medicação para dormir e o que faria para tê-la.
Das doenças que a Medicina trata, as "da alma" são as mais penosas. Penosas porque escondem o que realmente se passa com aquela pessoa e porque é mais difícil para o médico saber como o paciente sofre. Quando uma pessoa nos diz "tenho uma dor na barriga" vários diagnósticos e várias medicações passam nas nossas cabeças, mas quando dói ali dentro da cabeça (e que machuca no coração!) é bem diferente.
Fiquei pensando o que passava aquela mulher que nos dizia não ter mais plano nenhum para o futuro. E no que ela pensou enquanto falávamos que ela devia animar-se, procurar fazer alguma atividade física, conversar com o psicólogo... Talvez ela se risse pensando: eles devem estar brincando; será que não ouviram que eu disse que não tenho planos para o futuro? Ou talvez ela chorasse, e ESSAS LÁGRIMAS ERAM OS FIAPINHOS DE ESPERANÇA QUE ELA DEPOSITOU NA GENTE. "Ingênuos! Palavras não curam dor da alma."

Homens: todos iguais?

Imagem retirada de noticias.r7.com
Hoje eu fiquei inesperadamente feliz. Feliz porque algo que eu não esperava aconteceu. Todos sabem que homem se cuida menos, vai menos ao médico, pensa menos em seu corpo. Geralmente, digo!
Acompanhando um serviço público, iniciaram-se os atendimentos. E tivemos a oportunidade de atender algumas mulheres... e alguns homens! Preocupados com o coração, com as artérias, com a cabeça. Homens que estavam faltando trabalho, deixando algumas horas de sono de lado, esperando em uma fila enorme de posto! Foi muito bom saber que há uma possibilidade de mudar a tão batida frase de que HOMEM NÃO VAI A MÉDICO!
Um deles me chamou atenção por estar lá para cuidar da pele. Estava com um problema que há algum tempo o constrangia e procurou o atendimento médico. Conversou sobre suas atividades e perguntou como aguentávamos as aulas de anatomia, que ele não conseguiria, "médicos são frios". Eu ri disto. Falar francamente da nossa frieza foi singular em um dia de tantos "mesmos atendimentos". Porém mais singular ainda foi poder perceber que homem não procura médico só porque sente dor, como tenho escutado desde que comecei a estudar Medicina. Aliás, desde que comecei a entender o que é um atendimento médico...

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Quanta dor ela aguenta?

Imagem retirada de: bbel.uol.com.br
Quanto dói uma pancada? E a vergonha de tê-la aguentado calada? Qual a dor de estar acompanhada por um homem que não lhe respeita, que lhe trata com desprezo e que lhe tortura? Quanta dor aguenta uma mulher?


Entrou acompanhada da irmã. Parecia envergonhada por ter que responder mais uma vez à fatídica pergunta: como foi que aconteceu isso com a senhora? Havia pouco mais de cinco pessoas na sala, excetuando-se paciente e acompanhante, e, antes que aquela respondesse, a acompanhante antecipou-se: FOI O MARIDO DELA, EU JÁ DISSE 'PRA' ELA DAR PARTE DELE, MAS ELA NÃO DÁ! Ao que a paciente respondeu, "Ai, 'Fulana', tá bom, para com isso!".
Ela reclamava de dores na cabeça (onde ele havia esmurrado) e tinha cortes próximo aos olhos. A acompanhante havia dito que não era a primeira vez que isso havia acontecido e que ela "só podia era gostar de apanhar" porque não tomara nenhuma atitude!
O médico começou a atendê-la ao passo que lhe dava lições de moral, do tipo "Largue esse homem" ou ainda "Denuncie na polícia"...
Eu fiquei ali, assistindo ao procedimento e imaginando o que se passava com aquela mulher. E me veio a mente histórias que eu conhecia de mulheres que eram diariamente subjugadas e não tinham opção de simplesmente "deixar seus maridos". Não é fácil! Não é assim como a mídia às vezes pinta, jogar tudo para o alto e seguir a vida. MAS O PRIMEIRO PASSO É NECESSÁRIO, E ESTE É CERTAMENTE O MAIS DIFÍCIL! Das mulheres que eu acompanhei nos plantões, todas tinham as mesmas características: vergonha do que passavam e dificuldade de tomar alguma atitude. Fica claro, então, que não se trata apenas de uma questão de escolha, mas também de ter como se sustentar, de ter quem lhe apóie nessa decisão, de saber que há vida diferente daquela realidade. As mulheres que apanham (ou que são submetidas a outras humilhações) não permanecem nessa situação por livre escolha, mas porque sentem-se fragilizadas para tomar um posicionamento. E é doloroso olhá-las naquela situação!