quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Muito obrigado, muito obrigado

Imagem retirada de expressobullying.blogspot.com.br
Haviam-me avisado que o familiar estava lá fora para que me informasse o que ocorreu com sua mãe. Um homem me esperava um tanto nervoso. Ao me apresentar, iniciei uma sequencia de perguntas: "ela teve febre?", "desmaiou?", "sentia dor há quantos dias?". Perguntei, perguntei, perguntei, mas não era isso que ele queria me falar. Ele queria saber se sua mãe sairia daquela e, SÓ DEPOIS DA MINHA DESELEGANTE ATITUDE, PERCEBI QUE SEUS OLHOS ESTAVAM MAREJADOS DE LÁGRIMAS. E que ele tinha uma fala aflita de que está prestes a desabar. E que todo seu corpo gritava um pedido de ajuda. Depois de apoquentá-lo com tantos questionamentos, e só então percebê-lo humano, é que parei e vi o que havia feito: precisava confortá-lo na sua dor.
Assim, falei calmamente da situação de sua mãe, de como havia chegado e o que já havia sido feito. Disse que havíamos examinado-a há pouco tempo e que foram prescritas determinadas medicações. Aos poucos ele foi expondo suas aflições, do quanto tinha medo de que ela falecesse. Na despedida, ele agradeceu bastante as explicações, da mesma forma que o fez quando retornou mais tarde, no horário de visitas.
Então, fiquei pensando em como esquecemos muitas vezes de atender à simples necessidade de informar claramente os familiares, falar a real situação e orientá-los. Estava com a sensação de que todos agíamos assim, perguntando o que a pessoa sabia sobre aquele caso e pronto, afinal havíamos conseguido o que queríamos. Esse pensamento estava rondando minha cabeça enquanto retornava à sala, quando deparei uma médica falando com outros acompanhantes. Ela terminava a explicação e perguntava se alguém tinha algo mais a perguntar. Apertou-lhes as mãos, uma por uma e mostrou-se disponível afirmando que passaria o dia lá, caso precisassem. Bem, nossa saúde pública não está perdida. Não está!

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Ida a outro mundo, ainda em vida

Imagem retirada de nucleoholistico.com.br
Eu já havia entrado em UTI's outras vezes, porém começar a estagiar em uma delas me levou a algumas observações interessantes sobre os pacientes, os familiares e a equipe de trabalho.Tenho visto, por exemplo, que eu própria tenho um zelo extremado no que se refere ao silêncio. E, bem, algumas vezes me pego incomodada quando algumas pessoas não respeitam esse silêncio que eu espero das UTI's. Entretanto, impressões pessoais a parte, o que me tem chamado atenção é a relação que existe entre os pacientes e os familiares. Eles ficam muito tempo esperando lá fora, atrás do vidro, até que alguém surja e diga que é permitido que entrem. Aproximam-se e mal recebem as instruções de como se portar (afinal, não é obrigação deles que saibam que os pacientes podem estar infectados com bactérias multirresistentes, "ou seja lá o que isso quer dizer"!), mas prontamente recebem chamadas pelos pequenos erros que vêm a cometer: encostar em materiais contaminados, vestir os jalecos descartáveis e jogá-los em locais inapropriados, soltarem as contenções que evitam que o paciente desconecte os fios que trazem e levam medicações, etc.
Os parentes olham lentamente o familiar, como se o simples olhar pudesse machucá-lo de alguma forma. Geralmente não trazem lágrimas ou contêm estas até que o paciente não as possa ver. É difícil também ser familiar. Não se está acamado e sofrendo dores, mas se está lutando com seus sentimentos. Sentimento de saudade do ente que está no hospital, pena de vê-lo naquela situação, cansaço pelas frequentes idas ao hospital, estresse por conta dos problemas que este deixou por resolver.
Não sei se foi apenas impressão, mas estes visitantes são mais contidos que os demais de todo o hospital. Estão mais mastigados pela demora da recuperação, talvez, ou apenas entendem que não adianta, como em outras partes do hospital, gritar com o corpo de enfermagem por atenção ao seu parente: eles recebem atenção necessária, 24hs, mas não depende apenas de atenção. "Há mais mistérios entre o céu e a terra do que supõe a nossa vã filosofia", e assim prosseguem as visitas nas UTI's: PARECEM SERES QUE SAEM DO SEU MUNDO POR ALGUNS INSTANTES PARA VISITAR PARENTES QUE MUITAS VEZES NÃO LHE PODEM FALAR OU MESMO VER, MAS AINDA ASSIM DEIXAM SUAS REALIDADES PARA VIVENCIAREM AQUELES MOMENTOS.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Vida sob uma linha

Imagem retirada de hscj.com.br
Todos da sala ficaram alarmados, como de costume, com a entrada daquele paciente em parada cardíaca. Havia, há pouco, comentado com um colega sobre uma postagem do blog (ler aqui) e o fato de que as reanimações cardíacas muitas vezes nos frustrava. Iniciaram-se os procedimentos de praxe e corremos para nos paramentar para a reanimação. O primeiro estudante, ele próprio, iniciou as massagens. "Um minuto", gritava a doutora que estava fazendo a contagem; "Troca", subiu outra colega para reanimá-lo.
Não conseguia parar de pensar no fato de que era um paciente relativamente jovem que estava ali, nas mãos da equipe, que dependia das massagens, das medicações, da eficiência do serviço, da sua própria constituição física e, sim, de sua sorte. Muitos fatores que influenciariam o seu retorno ao "ritmo cardíaco regular, em dois tempos, bulhas normofonéticas, sem sopro", e dentre estes fatores estávamos nós!
Quando me aproximei para massageá-lo, posicionei-me em frente ao seu tórax, mão dominante abaixo da outra mão, braços retos e comecei a contagem. Uma outra colega havia me dito na semana anterior uma maneira de contar o ritmo da massagem, mas desisti na quinta compressão porque aquele ritmo simplesmente não conseguia entrar no meu cérebro. Fui para o tradicional "e 1 e 2 e 3..." e fiquei assim pelos próximos dois minutos. Não sei, mas olhei apenas rapidamente para o rosto daquele senhor. Diferentemente da senhora do outro texto, naquele dia não queria que, além da minha frustração, os pensamentos sobre a sua vida e família me ficassem rondando por tanto tempo. Mas foi inevitável não pensar neles! E UM TURBILHÃO DE IMAGENS COMEÇOU A DANÇAR NA MINHA CABEÇA MAIS UMA VEZ, COMO SE QUISESSEM ME PROVAR QUE NÃO ADIANTA QUERER SEPARAR A RAZÃO DO CORAÇÃO, ELES ANDAM COM NAMORADOS, DIRIA ATÉ COMO RECÉM-NAMORADOS, MÃOS DADAS E BEIJINHOS: NÃO SE DESGRUDAM, NÃO ADIANTA!
Quando a voz da doutora me trouxe de volta à sala, vi que era hora de checar o pulso. Virei-me para o monitor e vi que a "linha de sua vida" estava pulsando. Mas isso não significaria muita coisa se a doutora não houvesse dito, junto a essa observação, que o paciente tinha pulso palpável. Ele tinha pulso!!! Tínhamos reanimado o paciente com sucesso! O meu colega olhou para mim e seus olhos tinham um brilho tão particular de quem diz " Conseguimos". A despeito da nossa vitória particular, os demais pareciam já ter visto isto demais. Nós dois não, ele repetia "Conseguimos", eu queria gritar! Nossa primeira reanimação com sucesso, como não ficar feliz?
Liguei para a minha mãe para avisar, disse ao meu namorado, comentei com os colegas. Claro, não havia feito nada sozinha, mas fiz um pouco pela volta daquele paciente. Ah, fiz sim!

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Eu, gripô

Imagem retirada de rafaelasahib.blogspot.com
Engraçado como são as coisas da vida. Parece que quando você é estudante da área da saúde, todos os seus amigos e parentes querem que você esteja 24hs agindo como profissional da saúde. E tudo isso se torna pior quando você adoece!
Esses dias estive doente e eu nunca (leia-se "nunca") gostei de tomar remédio. Tenho pena do meu fígado e me dói quando vejo as pessoas tomarem paracetamol como água. Sim, eles tomam. Isso é, inclusive, motivo de "mini-discussões" frequentes com meu namorado. Paracetamol e antibióticos.
Enfim, estive doente esses dias e acreditei ser uma bobagem. "Água e descanso" foi minha auto-prescrição! Depois vieram as "meisinhas" da minha mãe: tome suco de laranja que é ótimo pra isso, beba esse melzinho, cheire essa infusão de Vickâ e água, tome esse remédio. Eu fui piorando. Depois de três noites sem dormir, segui o conselho de amigos e mãe: fui ao médico.
Bem, eu estava mesmo doente, precisando de remédios e antibióticos. Remédios dos quais eu nem imaginei precisar.
Sim, nós da área da saúde queremos ser auto-suficientes, mas não é fácil. Além de não sabermos de tudo e de algumas vezes não pensarmos em certos diagnósticos (por não sermos especialistas naquela área), ainda tem os amigos/familiares para nos lembrar isso... e falar, falar, falar. Agradeço-os pela ajuda, claro. Mas escutei muito esses dias.
- Doutora, doutora, não quer se cuidar!
Agora a "doutora" está se cuidando e está "noiada". Comer de três em três horas e tomar todos os remédios mandados. A minha mãe agradece!




p.s.: Esse texto é dedicado à Lourdinha, Nati e Pedro Jorge.