sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

"Olho para você, mas não te vejo..."

Imagem retirada de dentalgn.com
Nós estamos sempre sendo observados, analisados e julgados... pelos pacientes. Eles têm a curiosidade de saber se somos bons profissionais, se não vamos machucá-los, se estamos de mau-humor, se..., se..., se...
Esses dias fui surpreendida por alguém que me observava na enfermaria de um grande hospital. Eu estava procurando o professor e parei um segundo para vestir o jaleco. Displicentemente, coloquei minha bolsa e livros sobre uma bancada e me virei. Uma senhora, que passava no corredor, cruzou "a vista" comigo e involuntariamente eu lhe sorri. Sorri e continuei o processo de vestir o jaleco.
De repente, aquela senhora parou e pediu-me licença para falar:

Pois não?
É que, desculpe estar falando isso com você, mas é que EU FICO MUITO FELIZ QUANDO ALGUÉM QUE PASSA POR MIM ME DÁ UM SORRISO. Tem gente que passa e parece que nem vê a gente!
Parece que têm um "rei na barriga", né?
É, é só isso, com licença.

Aquilo ficou martelando na minha cabeça. Desde quando aquela senhora estava no hospital? E mais: quantas vezes havia passado por vários e vários estudantes/médicos, e eles não teriam percebido sua presença?!
Não sou a simpatia em pessoa, minha timidez beira inclusive a antipatia, talvez por isso esse fato tenha me tocado tanto. Porém, em um ambiente em que as pessoas pedem um pouco de atenção às suas vidas, MUITOS DE NÓS AGEM COMO PEQUENOS DEUSES NA TERRA. Como se uma "apoteose" (transformação em deus) ocorresse quando entrássemos para a faculdade. Certa vez, ouvi a seguinte frase (e peço desculpas por minha falha memória não me permitir citar o autor): "Quando uma pessoa faz Medicina ela acha que é Deus... quando ela se forma, ela passa a ter certeza disso!". Não sejamos assim! Isso não é digno para o ser humano, menosprezar os demais por julgar-se mais.
Depois encontrei a mesma senhora, ela estava acompanhando o marido doente. E, ao revê-la, me veio a mesma sensação que me acompanha desde o primeiro dia que eu entrei naquela enfermaria: os pacientes têm sempre muito a nos ensinar!

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Série "Outras Impressões" - Médicos devem dar seus números de telefones para pacientes?


Na quarta edição da série "Outras Impressões" compartilho com vocês o texto de Natália Suellen, estudante da Universidade Federal do Ceará, que trata de um tema que nos remete muitas reflexões... tratar todos os pacientes de maneira equânime. É uma constante luta pessoal de muitos profissionais (e estudantes) que desejam fornecer ao paciente o que eles necessitam, sempre!

Natália Suellen - estudante de Medicina
"Médicos devem dar seus números de Telefones para pacientes?
Após cinco (5) anos de curso de Medicina, muitos conceitos já estão estabelecidos e comporão minha conduta inicial como médica.
Certas questões éticas ainda em discussão como o aborto, a eutanásia, o atendimento de familiares e amigos, apesar de longe de serem unanimidade, não me impedem de me posicionar por uma ou por outra decisão, desde que bem amparadas numa argumentação lógica e coerente.
Uma questão bem mais simples, a meus inexperientes olhos, é a de como deve ser uma Relação Médico-Paciente aproximadamente ideal. Para tanto, acima de tudo, respeito máximo ao paciente e ao seu sofrimento.
Outros itens básicos desta prescrição seriam:

  • Conquista diária pela confiança do paciente
  • Postura ética adequada (não é porque os seus valores são diferentes dos do paciente e é óbvio que você não os precisa mudar, que você vai expô-los)
  • Proximidade e distanciamento adequados (avaliar diariamente a proporção entre as pontas desse espectro tão dicotômico)
  • TRATAR IGUAL OS DIFERENTES...

E foi nesse último que me detiveram hoje.
Numa conversa informal no ambulatório com os residentes e a staff, tocou-se no assunto de quando seria a ocasião/situação que justificaria a um médico dar a seus pacientes seu número de telefone celular. De todos ouvi que é preciso saber selecionar para que pacientes e casos abrir essa janela para sua vida pessoal.
Da maioria, ouvi que essa intimidade só deve ser oferecida a pacientes de consultório particular...
Eu não entendi bem o motivo dessa distinção, e tive medo de perguntar porque tive quase certeza de que a justificativa me agrediria e retiraria boa parte da admiração que eu tinha por aqueles profissionais(?).
E mais uma vez, eu me posiciono sozinha quanto à minha conduta futura. Tratar igual aos diferentes e RESPEITAR AS PESSOAS, DA MESMA FORMA QUE EU PROCURO FAZER NA MINHA VIDA, pois, na verdade, não deve haver diferença!"

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Portar-se e Importar-se

Imagem retirada de http://www.mocadosonho.com
Obviamente médico também é humano. E como humano, está suscetível a comportamentos e erros como qualquer pessoa. Porém, cabe ao profissional saber até que ponto ele tem o direito de cometer esse erro, sem agredir o paciente.
A história que vou contar hoje é mais um desabafo. Estávamos em uma aula em um ambulatório de um grande - e importante - hospital. Muito educadamente, o profissional médico explicava alguns assuntos da sua prática ambulatorial a medida que atendia os paciente. Primeiramente, devo ressaltar que algo na postura dele me chamou atenção de cara: ENQUANTO ELE ATENDIA O PACIENTE E NOS EXPLICAVA O CONTEÚDO, ELE ATENDIA O CELULAR QUE NÃO FOI COLOCADO NEM NO SILENCIOSO E QUE NÃO PARAVA DE TOCAR. Era um festival de "diga tia, não tô em casa, não" que não escapou aos olhos e ouvidos de quem estava presente. Via inclusive pacientes incomodados e na dúvida se o médico estava conversando com eles ou com alguém do outro lado da linha. Houve até quem fosse recebido com um caloroso "Tudo bom, bichão?!", foi quando eu tive a dúvida se eu estava no consultório ou assistindo a uma partida de futebol com os amigos.
O fato é que, lá estava ele em um serviço público - com seu jaleco que estampava um famoso convênio da cidade - atendendo os paciente. Então aconteceu o que lhes venho contar: alguns punhados de palavrões foram mencionados sem o menor critério, incorporados a linguagens como "tomografia computadorizada" e "adenocarcinoma". Como eu disse, somos todos suscetíveis acometer erros, porém eu não consegui parar de lembrar daquele velho livro de Alfred Benjamin, "A Entrevista de Ajuda", que fala como o médico deve se portar ante um paciente. PASSEI A ANOTAR O QUE EU ESTAVA OUVINDO  E, AO FIM, PODERIA TER FEITO UMA COMPILAÇÃO DE EXPRESSÕES POPULARES ESDRÚXULAS: p*rra, p*ta m*rda, p*ta que pariu, escr*to, é f*oda, vá se f*rrar, o buraco é mais embaixo (¬¬)...
Pois é, não quero com essas palavras parecer puritana, pois conheço todo esse palavriado, mas ainda acredito que deva existir uma postura ética que nos limita o uso delas com os pacientes.
"Suas palavras não me ferem, apenas me mostram seu retrato em uma moldura" Audinne Ferreira

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Diagnóstico Difícil

Foto retirada em acrturtle.blogspot.com
Pela primeira vez presenciei um dito "diagnóstico difícil". Estavamos - professor, turma , paciente e familiares - analisando um punhado de imagens de tomografias. O paciente, um senhor interiorano, simpático e participativo, nos contava como andava sem apetite, enquanto o professor conversava baixinho com o residente. Após os encaminhamentos e recomendações, o paciente e os familiares se retiraram da sala. Diagnóstico: câncer de pulmão. Obviamente que foram solicitados outros exames confirmatórios, porém era praticamente certo esse diagnóstico.
Algum tempo depois, já ao fim do expediente, os familiares retornaram para esclarecer algumas dúvidas sobre o que lhes foi dito e para que conversássemos melhor com eles. O fato é que o diagnóstico não tinha sido apresentado ao paciente que, ao ver do profissional que o estava acompanhando, era velhinho e não precisava de mais esse estresse na vida. Foi então que, com todas as palavras, foi compartilhado com os familiares que ele estava com um câncer e que os exames precisavam ser realizados com extrema rapidez. Um dos familiares, aparentemente a filha mais velha, começou a chorar enquanto o médico falava de como eram os exames e as opções terapêutica. Ao concluir o que falava, O MÉDICO CALOU-SE POR UM SEGUNDO E UM SOLUÇO ESTRIDENTE RASGOU O SILÊNCIO DA SALA.
Nós, estudantes, estávamos apenas observando, espectadores do choque de realidade, do que iremos conviver por longos dias: familiares tão necessitados de atenção quanto o paciente. O médico, impassível, disse apenas que o diagnóstico não era bom (ao que ela respondeu que era péssimo) e disse que ela tinha que se controlar para não transparecer a preocupação e dar forças ao pai. Falou ainda que ela poderia permanecer na sala o quanto precisasse e se retirou para seu merecido (?) descanço do almoço (10:30h).
NEM  UM LENÇO LHE FOI DADO, MUITO MENOS ALGUNS MINUTOS DO SEU DIA OU ALGUMA MIGALHA DA SUA PACIÊNCIA.