terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Primeiro nascimento...

Maria e Jesus
Aproveitando o clima de Natal (é... tem sim gente que está em clima de Natal! Eu - ainda - não!), vou falar um pouco da minha primeira experiência com partos... experiência eu digo porque o parto não é só retirar a criança da barriga da mãe (e não foi definitivamente isso que eu fiz), mas é tudo o que ocorre no entorno e na família. Como uma atividade de faculdade, fomos convidados para visitar a Maternidade-Escola da cidade, para que, além de ver partos e bebês na UTI, conhecêssemos o "clima" de um hospital. Então fui com um grupo de estudantes. Era um dia (das mães) movimentado, e cheio de partos. Não tivemos dificuldade de encontrar onde "assistir" esse primeiro parto...
Ao entrarmos na sala (era uma sala aberta, porta escancarada, funcionários que entravam e saiam) a mãe-adolescente já estava em intenso trabalho de parto. A dor estava estampada no rosto daquela moça e a barriga era quase do seu tamanho. Ao seu lado, a mãe segurava sua mão enquanto a mãe-adolescente gritava um grito preso na garganta - quase um urro! A médica era nova, residente, e a outra que lhe auxiliava também. Nosso grupo ficou perto da porta, logo na entrada, como se estivéssemos prontos para fugir a qualquer momento. NOS NOSSOS ROSTOS AQUELE PÂNICO DE "ESTOU AQUI E NÃO POSSO FAZER NADA"! Ao fim do parto, depois de uma "luta" muito intensa da residente contra o sangue que lhe respingava na roupa e no rosto(!), finalmente a mãe-adolescente pôde relaxar... o pai do bebê não estava ali, mas a mãe fazia papel do pai ausente e o dela própria!
Quando finalmente voltou a respirar sem entrecortar a respiração, olhou-nos na porta. Éramos quase dez, e ela fez um olhar de espanto. Perguntou quem era "esse povo todo" e disse nos disse que saíssemos. Claro que eu não fiquei chateada por isso, fiquei mais envergonhada por lhe roubar a privacidade. Mas aquele momento me marcou bastante...
À semelhança de Nossa Senhora, AQUELA MOÇA HUMILDE PASSAVA POR UM IMPORTANTE MOMENTO EM SUA VIDA. Outros parto virão, mas cada um trará um momento especial... Meus votos são de felicidade nesse Natal que se aproxima, para você e sua família e para as "milhares de Marias", santas ou não, mas que passam/passaram por essa emoção!

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Série "Outras Impressões" - Ainda é cedo demais


Estou dando início a uma série de textos de outros colegas (alunos da turma 2014.2 da Faculdade de Medicina da UFC) que têm algo a compartilhar do que aprenderam com os pacientes nesse ano (2010). O primeiro texto é de Urian Amorim Pontes, que retrata as suas impressões ante um paciente que tinha uma prognóstico dito "sombrio", de câncer com metástases hepáticas. Em uma escrita poética, ficam claros os confrontos que cada aluno trava consigo mesmo...

Urian A. Pontes - estudante de Medicina


"Eu tinha que estar sério diante da séria situação daquele senhor. Com ele sorrindo, diminuindo o arco senil pela elevação das bochechas que encobriam, parcialmente, seus olhos azuis. Eu estava certo de não executar nenhum Lemos-Torres, de não triscar em qualquer milímetro do seu alvo e álgico tegumento. EU PISAVA EM ESPINHOS DO JARDIM DAQUELE PACIENTE. Com o meu esteto teimando em cair, eu roía as unhas pensando em um bilhão de perguntas. E me distraía com a fatalidade de seus dias de péssimo prognóstico.
As colegas adentravam a um terreno tenebroso que se intitula anamnese. Entre cada arrumada de cabelo, as têmporas do paciente enrubreciam-se com cada nuance feminina impressa na enfermaria. Era um exercício de vida, porque sexo é sexo até nos últimos minutos da carne. Eu registrava cada percepção daquele local. Qualquer bolha construída de ações e reações incautas eram por mim colhidas, num papel que exacerbava o check-list da matéria, mexendo, tolhendo meus atos, patinando sobre as minhas convicções aberrantes de aluno decidido e pouco cartesiano. Acontece que o fôlego do paciente era demais para o seu estado. E, ali, todos arrotavam seus desejos instantâneos, numa situação inédita de transição.
Alguém me pegava de surpresa e me deixava em maus lençóis. Talvez eu confeccionasse um mecanismo de defesa do tipo imaturo para brincar com o meu próprio ego. Se o seu fígado tivesse jeito, decerto eu não estaria ali, no mais lúgubre labor de aluno-coveiro, deslizando em ondas verdes e rubras de bile e sangue, que, em átimos, apareciam no pensamento cruzado de todos os presentes. Visitávamos a morte. E havia espelhos de vida ao nosso redor.
Pena que a minha saga de médico começara ali, e eu mal notava. Eu estava comendo azeitonas pretas na situação amadora que escolheram para eu descascar. Sem opção  para não elaborar caras e bocas, na paisagem pálida que me ensinaram a esboçar rudemente, diante de qualquer amargura que pudesse me habitar. Era um transe que necessitava, sobretudo, de experiência. Sei que abnegação nem vontade faltavam, mas HÁ SEMPRE O BENEFÍCIO QUE SE CONSEGUE DEFRONTE A UMA ENTIDADE INESPERADA QUE SE CHAMA 'ROTINA DE JALECO BRANCO'.
Aprendi que o silêncio é arma tão poderosa quanto à língua. E é exatamente sob o silêncio que se colhe o que pode haver de mais íntimo n’outro. Abri gavetas invisíveis. Procurei feito detetive as marcas que faziam o jogo ficar interessante. E ficou. Não esperei alguém dizer ‘Il est encore trop tôt’, diante de um ser quase-médico. Eu caí. E levantei. Mesmo sabendo que ainda é cedo demais."

sábado, 11 de dezembro de 2010

O que dizer?

Foto retirada de http://oswaldobispo.blogspot.com/ 
Complementando o port anterior, venho contar-lhes uma história que aconteceu pouco antes de eu divulgar a enquete. Uma senhora me abordou para tirar uma dúvida. Disse que não sabia se eu já tinha passado por essa cadeira na faculdade (sic), mas que tinha um questionamento para me fazer. Queria saber o que faria com uma conhecida dela que, tinha tomado umas coisas (estava grávida) e ainda assim o teste de gravidez tinha dado positivo outra vez. O que dizer nessa hora?!
Bem, não passei ainda pelo módulo de Gineco e tão pouco me sinto preparada para abordar um tema tão delicado. Falei que procurasse um ginecologista para receber as orientações devidas, mas todos sabemos como são as filas nos postos de saúde... era capaz de a pessoa, quando fosse atendida, já tivesse com um filho de dois anos! Então, falei o que o médico provavelmente lhe diria, sobre os riscos do aborto não só para o feto, mas para a mãe, e tantas outras coisas que aprendemos na faculdade.
Mas, sinceramente, o que eu poderia ter dito? Lógico que, depois disso, eu procurei me informar melhor a respeito da conduta mais correta, porém eu fiquei bastante apreensiva com o que aconteceria àquela mulher. Alguns dias depois recebi a notícia de que deu tudo certo... bem, interpretem como sua consciência julgar. O fato é que A QUESTÃO DO ABORTO ESTÁ NO NOSSO DIA-A-DIA, E É NECESSÁRIO REFORÇAR QUE, MAIS CEDO OU MAIS TARDE, TODOS IREMOS DEPARAR ESSE DILEMA!

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Você é CONTRA ou A FAVOR do aborto?

Foto retirada de http://vivopelavida.com.br
Pode até parecer um tema enfadonho, mas o aborto é atualmente um dos temas que mais merecem ser discutidos e que precisam ser definidas diretrizes. Inicialmente por mexer em algo tão delicado: a definição de onde começa a vida. Em dois extremos temos: quem acredita que a vida começa na fecundação do óvulo e quem acredita que começa no nascimento. Entre esses extremos, temos outras definições. Como meu intuito não é abordar de maneira científica - e sim expressar uma forma de ver a vida - tratarei o tema do ponto de vista do alvo desse blog: o paciente. A QUEM IMPORTA O SER QUE SE DESENVOLVE NA BARRIGA SENÃO, ANTES DE TODOS, ÀQUELA QUE O CARREGA POR MESES? Após a própria criança que está a crescer, a mãe é quem irá permitir que no seu corpo se desenvolva aquele novo cidadão, sendo ela quem sofre as pressões (pressões próprias ou de outras pessoas/do meio). Assim, como pode uma mãe não se preocupar quando se vê em uma situação de risco, sem ter como alimentar seu filho? Não digo que isso é justificativa para o aborto, mas é algo a ser levado em conta na abordagem do tema. Outro fato são as gravidezes de risco. QUANDO "CRIANÇAS" FICAM GRÁVIDAS, A QUEM CONDENAR? Digo condenar porque abortar é condenar alguém a morte e permitir que o bebê nasça é condenar à criança-mãe a uma vida que ela própria não escolheu. Outra coisa que a questão do aborto implica é a família. A imagem de uma família estruturada pouco a pouco se desfaz na mente da sociedade (generalizando, claro!), então será que é crime permitir que uma criança nasça sem a devida estrutura familiar? Ou crime mais grave seria privá-la da vida, para que não sofresse as consequências do meio em que seria inserida?!
É importante ressaltar que TODA PESSOA QUE COMETE UM ABORTO ESTÁ EM SITUAÇÃO DE RISCO. O risco a que me refiro não é somente o risco financeiro e social, mas o risco psicológico também. Mães que teriam condições de dar uma boa situação financeira ao filho "não-desejado" e cometem aborto o fazem por estarem também em situação de risco. Quantas pessoas precisariam apenas de apoio psicológico para não cometerem o aborto? Então, essa questão é bem mais ampla do que apenas "questão financeira". São jovens com medo da reação dos pais, mulheres que foram abandonadas por seus maridos, mulheres que apanham... são diferentes situações que convergem em um só ato: o aborto.
A enquete feita aqui no blog (Você é CONTRA ou A FAVOR do aborto?) trouxe a tona duas questões a se pensar, que é como anda nosso conceito do certo/errado e como a lei nos ampara quanto a isso. O resultado da enquete foi:
Você é CONTRA ou A FAVOR do aborto?


  • Terminantemente contra: 23%
  • Dependendo do caso, sou a favor: 53%
  • Completamente a favor: 15%
  • Não tenho opinião formada: 7%

Como está na nossa Constituição, em geral, as pessoas são a favor do aborto dependendo do caso. Mas isso não quer dizer que é o correto. Para cada item acima há uma justificativa. Quem é "Terminantemente contra" pode apoiar-se nos preceitos bíblicos que falam contra o assassinato e do qual Deus dá-nos o mandamento "Amar o próximo como a ti mesmo". Quem votou em "Dependendo do caso, sou a favor" apoia-se no fato de que ter um filho de um estuprador, por exemplo, não é salutar nem para a mãe, tão pouco para a criança - fruto de um ato inescrupuloso. Quem afirma que é "Completamente a favor" pode garantir-se no direito do indivíduo sobre o seu corpo, que somente ele sabe de todas suas limitações, anseios e desejos. E quem votou em "Não tenho opinião formada" pode ainda enfrentar muitos dilemas ao ler esse texto, mas o fato é que não é tão fácil pesar o que é mais importante: se o direito da mãe sobre sua vida, se o direito do ser - que é indefeso - de viver!

domingo, 5 de dezembro de 2010

Medo do que vai acontecer

Ciência e Caridade (1897) - de Pablo Picasso
É inevitável que, diante de uma doença, tenhamos medo do que possa acontecer conosco e aos nossos familiares/amigos. Imagine então como se sente alguém que recebe o diagnóstico de uma doença que há muito é estigmatizada, tanto pelos profissionais quanto pela população em geral: o câncer. Não que não tenham motivos para estigmatizar a doença! A estimativa do INCA para 2010 foi de quase 50 mil novos casos de câncer de mama e mais de 26 mil de câncer de pulmão, por exemplo. Além disso, para cada caso há um tratamento, o que faz dele um diagnóstico temido pelos pacientes.
Sendo assim, trato nesse texto dos possíveis erros cometidos pelos profissionais que lidam com esses pacientes. Manter a calma do paciente é essencial para um bom relacionamento com ele, além de ajudar no tratamento. Foi-me relatado que uma paciente contava ao médico A (que iria estipular-lhe o tratamento) sobre a consulta do médico B (que deu o diagnóstico) e o que este havia lhe dito. Ela falou que o médico B disse que, baseando-se nos exames, a possibilidade de cura do câncer era 100% se ela seguisse corretamente o tratamento e as recomendações médicas. O médico A imediatamente lhe disse: "NÃO EXISTE ESSE NEGÓCIO DE 100% DE CURA NÃO, QUEM FOI QUE LHE DISSE ISSO? QUEM FOI?!" Ainda que essa informação não fosse correta (o que eu não tenho embasamento científico para argumentar), é papel do médico "não destruir as esperanças" de um paciente. No livro "Sobre a Morte e o Morrer", de E. Kübler-Ross, é dito que a esperança é parte importante não só para o "comportamento" do paciente, mas para o seu tratamento. Ressalto, então, que haveria outras formas de lhe comunicar a verdadeira situação (em não sendo verdade).
Outro fato que lhes conto desse médico A é que, com uma outra paciente, agiu também de forma grosseira. Quando ela chegou a seu consultório para receber o tratamento, ele leu os exames e disse-lhe: "É, SEU REMÉDIO É ESSE AQUI, MAS TRATE DE CORTAR LOGO ESSE CABELO PORQUE VAI CAIR TUDO". Não digo que o médico tem que abraçar e colocar o paciente no colo, mas pelo menos deve por em prática o que nos ensinam (em algumas disciplinas): a empatia (leitura sugerida: "Você é meu") , pôr-se no lugar do paciente.
De fato, isso ocorre em vários consultórios, o tempo todo. É triste saber que alguns profissionais que estudam para "promover a saúde" ajam de formas tão esdrúxulas, sendo por vezes desumanos.
"A todos os que sofrem e estão sós, dai sempre um sorriso de alegria. Não lhes proporciones apenas os vossos cuidados, mas também o vosso coração" Madre Teresa de Calcutá

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Qual sua dificuldade?

Foto retirada do blog asrodinhas.blogspot.com
Hoje, 3 de dezembro, comemora-se o Dia Internacional de Luta dos Portadores de Deficiência e meu post será sobre um portador de deficiência visual que tive o prazer de conhecer. Nem todas as aulas da faculdade são tão, digamos, interessantes, mas algumas vezes nos surpreendemos com elas. Esse portador, que não vê problemas em ser chamado de "cego" (como muitos de nós, inclusive eu, pensamos), foi esclarecer pontos importantes e ignorados por nós. É desnecessário dizer que por sua personalidade forte e suas conquistas na vida (estava fazendo faculdade... de novo, pois já era formado em uma), ficamos todos embevecidos pelo seu relato. O que me chamou bastante atenção foi uma das observações feitas por ele a certa do tratamento que recebia dos profissionais de saúde. Disse que, certa feita, ao entrar no consultório médico, o doutor, ao avistá-lo e perceber a sua condição começou a consulta... gritando!!! Ele disse para a gente: EU SOU CEGO, NÃO SURDO! E muitas vezes, por ignorância (leia-se "não-conhecimento") ou por falta de traquejo, tratamos os pacientes portadores de deficiência de uma maneira, digamos, preconceituosa.
Muitos profissionais tratam as pessoas com deficiências físicas como se não tivessem possibilidade de entender, e isso é algo a ser abertamente discutido nas faculdades, nos hospitais, nos parlamentos... não se trata de uma questão de defesa de ideais, mas de cidadania. Outra coisa que aprendi nessa disciplina foi ver que os deficientes não são corretamente ouvidos; por exemplo, uma moça foi a um consultório, cega e grávida, e o médico disse que só explicaria como cuidar da criança quando ela viesse com mais alguém, ... isso dispensa comentários!
Outra questão interessante é que se fala tanto em integração dentro das faculdades, mas na nossa própria faculdade há prédios que cadeirantes não conseguiriam entrar. E é um prédio público! Bem, a questão trás bem mais problemas do que caberiam nas minhas palavras, então seguem alguns links para quem quiser saber mais um pouco da vida dos portadores de deficiência.




Ah! Mais uma coisa, sabe o que o palestrante-cego nos disse, COISAS DO SEU DIA-A-DIA QUE AS PESSOAS NÃO VÊM: disse que sua mãe às vezes lia para ele os livros da faculdade (quando não tinha disponível em Braille), o relógio dele dizia que horas eram e que ele percebia mudanças que alguns namorados/companheiros (que enxergam) não percebiam em suas namoradas... e isso lhe valia algumas discussõezinhas e algumas conquistas!