sexta-feira, 19 de novembro de 2010

"Você só teve uma parceira? E parceiros?"

Foto retirada de http://medicineisart.blogspot.com
Toda pessoa, antes de ser paciente, possui uma vida, seus desejos e seus pudores... O interessante é que, nessa correria de ¹pegar informações, ²dar o diagnóstico e ³medicar, nós podemos esquecer que aquela pessoa tem outros pensamentos que não a sua doença. Por isso, devemos entender que PODE SER DIFÍCIL PARA O PACIENTE FALAR SUAS INTIMIDADES A UM DESCONHECIDO, ainda que seja para auxiliar no diagnóstico da sua enfermidade!
Passei por algumas situações e ouvi outras que merecem ser repassadas. Certa feita, enquanto colhíamos a história de um paciente (♂), chegamos na parte de perguntar sobre seu comportamento sexual e outros dados relacionados. Antes disso, o paciente falou sobre tudo, sem hesitações. Como era um das nossas primeiras entrevistas o(a) professor(a) passou a fazer as perguntas pela turma: "possui vida sexual ativa?", "possui parceiro(a) fixo?", "possui relacionamento extra-conjugal?", "já teve alguma relação do tipo homossexual?"... E o paciente foi gradualmente baixando a voz e ficando tímido para responder... Reconheço a necessidade de se conhecer esses dados, mas nem todo caso isso possui tal relevância a ponto de ser esmiuçado como estava sendo feito. O fato é que, mesmo voltando ao normal após essas bateria de perguntas, havia ficado uma sensação "chata", e apesar de saber que SEGREDOS SÃO GUARDADOS CONOSCO DIARIAMENTE, aquele homem (com toda sua vida, suas histórias e sua individualidade) tinha contado coisas bastante pessoais. Após o primeiro contato com esse tipo de abordagem, fui colher a história de uma paciente (♀), adolescente e muito apegada à mãe (que estava presente). Aproveitando um instante oportuno para fazer-lhe "essas perguntas", notei duas coisas importantes: ¹ é difícil encontrar um paciente que não se assuste/constranja com essa abordagem e ² QUALQUER PERGUNTA ÍNTIMA QUE SE VAI FAZER DEVE SER FEITA DA MANEIRA MAIS NATURAL E MAIS INDIVIDUALMENTE POSSÍVEL. A maioria dos nossos hospitais públicos não possui salas isoladas (algum possui?), então deve-se esperar que o paciente esteja só e fazer a pergunta com um tom de voz baixo.
Certa vez me relataram um caso que nos mostra a complexidade e variação de reações quanto ao tema "relações sexuais" na conversa com o paciente. Esse(a) meu(minha) colega foi conversar com uma senhorinha e estava apreensivo(a) sobre como abordar esse tema e como seria a reação da paciente. Quando foram iniciadas as perguntas, a senhorinha simplesmente respondeu-as e começou a falar da saudade que tinha do marido, do seu lar e de como ele ligava para ela muitas vezes. Falou de suas lembranças e saudades e, ao fim da entrevista, agradeceu e pediu que ele(a) lhe desse um abraço (fez questão de levantar-se para cumprimentá-lo(a) ). Outro caso foi o oposto... no meio da conversa sobre a doença, o(a) paciente entrou no assunto sexualidade e falou sobre suas preferências sexuais. O(A) acompanhante olhou-o(a) e se retirou, visivelmente incomodado com aquele assunto.

Ressalto aqui a importância de preservar o segredo médico (e o segredo de enfermeiros, de auxiliares de enfermagem, de farmacêuticos, de odontólogos, de fisioterapêutas, etc, etc...) e de respeitar o paciente quanto a isso. Por fim, é necessário cuidado e atenção no nosso diálogo com o paciente sobre quaisquer assuntos, mas é de extrema importância que a sexualidade seja abordada de forma natural, índividual e que se mantenha sigilo sobre o que nos é dito. Como eu havia falado, OS PACIENTES TÊM VIDA FORA DA SUA DOENÇA!

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